Momento marcante na vida dos nossos filhos é quando eles nos deixam no local de trabalho para irem viver a vida deles na escolinha. Sentem-se preocupados como vamos ficar. Como vamos reagir aos novos colegas de trabalho. Como vai ser o nosso almoço. A nossa sesta. Enfim como é que vamos crescer longe deles. Isso preocupa-os.

Lembro-me do primeiro dia da minha filha na escolinha. “Até logo filha. Amo-te muito.” Virou-se e foi brincar. Desci as escadas a correr porque a barragem da menina dos olhos estava quase a abrir. Decidido a perceber o que se passava comigo cheguei ao carro e chorei. Uma sensação estranha estava agora a tomar o meu corpo. Parecia que tinha feito uma maldade tão grande à minha filha que a tristeza quase me empurrava para voltar lá. Controlei-me.

Fomos nós quem escolhemos a instituição. Confiámos na educadora e auxiliar. Porque raio está acontecer isto comigo?

As sensações não acontecem de geração espontânea. Muito menos esta em particular. Elas são o resultado da forma como vivenciamos as coisas que nos acontecem. Os acontecimentos são neutros. As coisas são o que são. Nós, através dos nossos filtros percetivos e memórias inconscientes, é que lhes atribuímos importância. Emoção portanto. E uma emoção estava a apresentar-se em cada lágrima.

Algo em mim tinha acordado. Sensação de abandono. A sensação que estava a abandonar a minha filha. Cognitivamente é um erro. Mas as emoções não mentem não tem lógica matemática. A sensação de abandono era minha. Eu é que me sentia abandonado. A minha criança interior acordara e com ela o pedido de ajuda para ser resgatada.

Ser pai ou mãe abre a porta às memórias da nossa infância. Muitas são boas. Outras nem por isso. Seja como for serão sempre úteis para elevar o amor incondicional a patamares superiores. Ganhamos todos com isso mas sobretudo os pequeninos que tem a missão de nos acordar para a realidade de amar e ser amados livremente.

Muitas vezes acabamos por projetar nos nossos filhos as nossas vivências. Isso inibe o compromisso com a paternidade. Cabe-nos o papel de estarmos atentos internamente. De escutarmos o que sentimos a cada momento e compreendermos a aprendizagem a ser feita. E fazê-la.

Neste processo transcender o nosso “eu” é uma inevitabilidade. Resta saber como cada um se permite fazê-lo. Com a alegria de quem se descobre ou com a dor de quem se esconde.

Mas nada nos impede de estarmos atentos à evolução deles na escola. Por isso é tão importante distinguir a origem do que sentimos. Se é deles ou nossa. Evitaremos muita coisa.

Boas descobertas.